Cadernos Junguianos – II

Cardenos Junguianos

Sumário

Editorial
5

Artigos

Fazer Alma Fazendo Teatro

Alexandre Silva Nunes
7

Psiquê na Pólis: a alma em busca da política

Roque Tadeu Gui
26

A Ética do Provisório

Silvia Graubart
61

Vox Dei, o Órgão, sua Mitologia e Música no Cristianismo Ocidental

José Jorge de Morais Zacharias
69

Conversando sobre Don Quixote

Áurea Roitman
104

A Infância de Jung e sua Influência no Desenvolvimento da Psicologia Analítica

Brian Feldman
104

Os Caminhos da Espiritualidade no Processo de Individuação

Joel Sales Giglio e Zula Garcia Ziglio
149

Entrevista

A Psiquê da América Latia por Luigi Zoja
48

Diálogos

Um Encontro de Axel Capriles com Rafael López-Pedraza
99

Resenhas

Lunalva Fiúza Chagas
165

A Presença do Imponderável em “Ponto Final”

Rubens Bragarnich
169

Waking Life

Renata Whitaker Horschutz
171

Dora Ferreira da Silva (1918 – 2006)
175

Orientações aos Autores para Publicação
176

 

Fazer Alma
Fazendo Teatro

Sinopse: Cultura e arte sempre foram tópicos de grande interesse para a reflexão da psicologia. Inicialmente, a psicanálise entreviu resíduos de distúrbios do poeta na obra: a arte como sublimação. Mas a perspectiva junguiana objetou tal redução, optando
por uma ampliação calcada na profundidade arquetípica. Essa perspectiva tem hoje a faculdade de uma ampliação ainda mais radical, onde a própria vida pode ganhar devir de arte, e o movimento da alma ser compreendido como gênese poética contínua.
A arte deixa de interessar apenas do ponto de vista profissional, reaproximando-se de correspondentes éticos, de modo que a individuação passa a ser compreendida como uma po-ética de vida: fazer alma. Neste artigo, a arte de ator, instauradora de
cosmos imaginários, serve de metáfora para a condição humana, no fluxo contínuo das personificações arquetípicas. Fazer teatro fazendo alma é apenas uma modalidade radical de fazer o que todo homem faz: personificar papéis no palco da vida.

Psiquê na Pólis:
a alma em busca da política

Sinopse: Este artigo apresenta algumas reflexões sobre a unidade homem-mundo e suas intercorrências de sofrimento. Antecipa a necessidade de encontrar um lugar no mundo para uma clínica analítica que lide com a dupla face da alma — individual e coletiva, situando a psiquê na pólis, sob risco de, não o fazendo, ignorar e violentar a dimensão política do Self. Procura, ainda, articular os conceitos de individuação e desenvolvimento político da personalidade na perspectiva de dois autores, um deles vinculado à psicologia analítica e o outro à educação libertadora. O autor conclui que a terapia para um mundo doente não virá apenas dos profissionais psi, mas de todos aqueles que despertem para a necessidade de cura do mundo em que vivemos, uma fantasia, certamente, mas que pode nos inspirar para os processos de transformação sociopolítica. Deixa como desafio a reavaliação dos referenciais analíticos, dos métodos e das práticas, de modo a integrarmos adequadamente em nosso trabalho a face política do Self. Esta tarefa passa, necessariamente, pela articulação da práxis analítica com outros campos do saber e do
fazer humanos, afastando-nos da hybris da auto-suficiência e do todo-saber.

A ÉTICA DO PROVISÓRIO

Sinopse: Minha intenção é refletir sobre uma questão das mais freqüentes no consultório de quem trabalha com adolescentes, adultos jovens e outros nem tanto. Por ética do provisório refiro-me ao “ficar”, o termo popularmente usado para retratar relações calcadas em sexo sem compromisso, supervalorização do corpo e do desempenho e quase total inconsciência dos processos psíquicos responsáveis pela ausência de envolvimentos afetivos verdadeiros. Encontro na sociedade globalizadauma das formas de entender esse fenômeno e no mito de Ísis-Osíris as raízes arquetípicas que modelam tal comportamento.

VOX DEI, O ÓRGÃO, SUA MITOLOGIA E MÚSICA NO CRISTIANISMO OCIDENTAL

Sinopse: Desde longa data, o cristianismo tem se utilizado do som do órgão em seus ofícios, o que conferiu ao instrumento a característica de instrumento litúrgico por excelência, expressando a vox Dei. Características históricas e tecnológicas do órgão concorreram para que assim fosse. No entanto este é um instrumento de origem pagã, e permaneceu suspeito aos olhos da igreja até o século XI. Inventado em Alexandria, em 270 a.C. surge imerso no universo mítico helenista que indica sua origem na flauta de Pã e em sua paixão pela ninfa Syrinx. Instrumento associado a Apolo e a Dioniso, ao céu e a terra, ao Logos e ao Eros, apresentou desde cedo sua qualidade de totalidade, seja na sua arquitetura encastelada ou como um cristal; assim como na sua extensão sonora aos limites da audição. Quando foi cristianizado, o mito de Santa Cecília substituiu o de Syrinx, no entanto o órgão continuou a representar aspectos celestes e ctônicos, como um símbolo estrutural e sonoro do Self.

Conversando sobre Dom Quixote

Sinopse: Falar de Dom Quixote e Sancho Pança nos remete ao universo paradoxal onde o prosaico e o sublime se mesclam numa tessitura de extraordinária intensidade humana. O episódio que escolhemos nos mostra um “Cavaleiro da Triste Figura”
cansado de tantas desventuras, imerso numa depressão que acaba eclipsando todo o vigor e ousadia de outrora. Sonhos e delírios fazem parte desse denso episódio que trata com toda a realidade os limites da paixão humana.

A Infância de Jung e sua Influência no Desenvolvimento da Psicologia Analítica

Sinopse: A infância de Jung é examinada à luz do desenvolvimento de suas teorias de psicologia analítica. O artigo tem como foco a análise de suas primeiras interações com os pais, seus primeiros sonhos, fantasias e devaneios e os padrões de relação que desenvolveu com pessoas significativas em sua vida. A discussão de Jung sobre suas brincadeiras infantis, seu relacionamento com colegas e suas reações ao fato de ter crescido no ambiente cultural suíço de seu tempo são também examinadas com a intenção de compreender suas relações com o desenvolvimento de uma perspectiva psicológica criativa e única. O artigo também examina o diagnóstico de uma psicose infantil, que Winnicott e a comunidade psicanalítica fazem de Jung, e contraria essa idéia com informações extraídas de Memórias, Sonhos, Reflexões que oferecem evidências convincentes de que Jung sofreu de uma depressão infantil, que com freqüência retirava-se para dentro de si mesmo de modo criativo, e que desenvolveu uma ativa vida de fantasia que o ajudou a garantir para si mesmo um sentido de segurança e integridade. A perspectiva do autor está baseada em sua experiência de muitos anos com análise infantil, observação de crianças e teoria das relações.

Os Caminhos da Espiritualidade no Processo de Individuação

Sinopse: Neste trabalho os autores fazem considerações teóricas a respeito do conceito de religião e espiritualidade, baseando-se, principalmente, em referências da psicologia analítica. Apresentam, a seguir, descrição resumida de uma pesquisa realizada com
sujeitos religiosos e mostram resultados advindos de duas das entrevistas, selecionadas por serem emblemáticas em relação ao corpo de informações obtidas no estudo. Para uma melhor análise dos excertos de entrevistas aqui citados, discutem o material segundo os seguintes eixos: religião e espiritualidade; religião como suporte para a individuação; religião versus Igreja versus autoritarismo; perdão; rituais; terapia pela palavra divina; religião e economia psíquica. Nas considerações finais, os autores fazem comentários sobre as relações entre religiosidade e individuação, bem como sobre a importância do conhecimento da história das religiões para a prática psicoterápica e analítica.