MARIO JACOBY (1925- 2011)

Por ocasião de minha ida a Zurique em fevereiro de 2011, pude conversar com John Desteian, representante da AGAP ( Associação dos graduados do Instituto C. G. Jung de Zurique) no Comitê Executivo da IAAP e ouvi dele o seguinte relato: estava ele em reunião de analistas em fim de ano em Zurique. Pediu-se então que entre os presentes, aqueles que tivessem tido no passado algum tipo de relacionamento com Mario Jacoby, fosse analítico, fosse de supervisão ou didático-teórico, que levantasse a mão. Grande parte dos presentes levantou a mão. Esse simples fato expressou em sua opinião a enorme influência de Mario Jacoby entre os membros da IAAP.

A recente perda de Mario Jacoby é um acontecimento dos mais marcantes para toda a comunidade junguiana. Mario Jacoby, ou simplesmente “Mario” para seus queridos amigos do Brasil e outros países, deixou para nós uma mensagem. A certeza de que se o mundo arquetípico se realiza no espaço subjetivo do indivíduo, ele se atualiza e se faz presente a todo o momento nos relacionamentos interpessoais. A importância viva dos relacionamentos foi a lição constante de Mário.

Mario nasceu em 1925 em Leipzig, na Alemanha. Quando tinha apenas quatro anos, seus pais se divorciaram e ele foi viver com parentes na Suíça. Sua mãe foi viver na Palestina, esperando que Mario fosse se juntar a ela posteriormente, o que nunca aconteceu, devido ao início da segunda guerra mundial. O pai de Mario, tendo permanecido na Alemanha, acabou se tornando em uma das vítimas do Holocausto. Forçado a permanecer na Suíça, Mario Jacoby acabou estudando para se tornar um violinista clássico. Procurou Jolande Jacoby para análise terapêutica pessoal e através de sua análise decidiu a se tornar analista e procurou o Instituto C.G.Jung de Zurique para fazer sua formação.

Com o passar dos anos, Mario se tornou um professor da maior importância na formação de inúmeras gerações de analistas no Instituto C. G. Jung de Zurique e também em diversos outros países, na Europa do Leste, nos Estados Unidos e no Brasil. Em todos os países por onde passou deixou a marca de sua sensibilidade, observação clínica refinada e cultura diferenciada.

Com relação ao Brasil Mario teve relacionamento especial, mesmo independentemente dos dois Grupos da IAAP que se formariam posteriormente em nosso país. A mãe de Mario Jacoby veio a residir em São Paulo. Mario vinha ao nosso país com alguma freqüência visitá-la, antes da formação dos grupos brasileiros. Posteriormente, com o início do movimento junguiano no Brasil na década de ’70 Mario Jacoby foi um dos ativos colaboradores do nosso movimento. Assim como em outros países, aqui deixou o registro de suas idéias e de sua personalidade sensível. Mario colaborou diretamente com ambas as Associações brasileiras da IAAP, a SBPA e a AJB em diversas vindas ao Brasil, oferecendo atividades didáticas em seminários, supervisões e Conferências.

À convite da AJB esteve diversas vezes no Brasil. Em 2000, esteve em Belo Horizonte onde proferiu palestra no Congresso promovido pelo Instituto C.G. Jung de Minas Gerais. Naquela ocasião ainda proferiu conferência no Hospital Pinel no Rio de Janeiro: “O Conceito de self em Jung e Kohut”. Mais recentemente, em 2008, sua última viagem ao Brasil, esteve em São Paulo a convite da SBPA e no Rio de janeiro.

Alguns de seus mais importantes livros foram traduzidos para o português: “O Encontro Analítico” (Ed. Vozes), “Saudades do Paraíso” e mais recentemente, “Psicoterapia Junguiana e Pesquisa Contemporânea com Crianças” (esses últimos pela Editora Paulus). Também seu curso sobre “O Conceito de Ego e Problemas de fragilidade do Ego” dado no Instituto C.G.Jung de Zurique no semestre de inverno de 1971 é apresentado em aulas de Pós-Graduação no Rio de Janeiro.

As difíceis experiências ainda em criança em seu próprio processo de individuação fizeram com que Mario Jacoby valorizasse de modo especial as relações infantis como elementos importantes na estruturação do ego. Pode então, a partir daí, fazer criativas pontes teóricas entre a psicanálise e a psicologia analítica. Aprofundou os aspectos significativos da transferência do ponto de vista junguiano, bem como se preocupou em fazer associações entre a psicologia analítica e conceitos da psicanálise, de modo especial, os conceitos de Heinz Kohut. A esse estudo aprofundado da transferência e do setting terapêutico, Mario sempre associou uma sensibilidade musical, um ouvido e uma receptividade próprios do violinista sensível. Lembro-me de Mario assim: uma mistura harmoniosa do músico-analista, atento às tonalidades emocionais do discurso de seu paciente, com plena atenção, mantendo sempre uma escuta plenamente afinada e amorosa com o discurso do seu paciente e a musicalidade de sua emoção.

Walter Boechat

Fonte: www.ajb.org.br